quinta-feira, 8 de julho de 2010

In fact, you're almost Alice.

Os livros de Lewis Carroll protagonizados por Alice, As aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do espelho e o que Alice encontrou por lá, são daquele tipo de história infantil que são apreciados também (e até muito mais) por adultos. Então, é uma decepção que o filme de Tim Burton - mesmo que seja apenas baseado na trama original - perca toda a profundidade do mundo criado por Carroll. Mesmo com um visual incrível e criaturas muito bem criadas a partir de efeitos especiais, o filme é bobo e tedioso. Anne Hathaway e Johnny Depp fazem o que podem com seus personagens, mas são atrapalhados pelo roteiro de Linda Woolverton - que obviamente acredita que o simples fato de ser interpretado por um ator como Depp seja o bastante para aumentar o tempo que o Chapeleiro Maluco tem em cena. Para isso foi criado, inclusive, um ridículo clima de "algo mais" entre o Chapeleiro e Alice. Para um roteiro entediante, uma protagonista entediante: a Alice de Mia Wasikowska parece uma garota mimada, que gosta de contrariar não porque pensa diferente dos outros ou não se encaixa na sociedade, mas simplesmente para ir contra o que esperam dela. E, apesar de ter crescido (em tamanho) desde sua primeira visita ao País das Maravilhas, sua inteligência não parece ter aumentado nada. O máximo de ironia a que o roteiro chega é quando Alice grita "Corte sua cabeça!" quando mata o monstro da Rainha Vermelha; frases irônicas dos livros como "Já cheguei a acreditar em seis coisas impossíveis antes do café-da-manhã" aqui são transformadas em lições de vida, e Alice chega a fazer uma lista dessas seis coisas (!!!) quando vai enfrentar o monstro. Várias frases são irritantemente repetidas várias vezes: o enigma do Chapeleiro, "Qual é a diferença entre um corvo e uma escrivaninha?", é dito quatro vezes; Alice fala em dezenas de ocasiões "É só um sonho, logo vou acordar, por que não estou acordando, blá blá blá". A única personagem com alguma profundidade é a Rainha Vermelha de Helena Bonham-Carter, ditadora que ordena que a cabeça de todos que a contrariam sejam cortadas e que usa seu poder e o medo que todos tem dela para disfarçar sua insegurança - possivelmente resultante de algum trauma envolvendo sua cabeçona. Os outros personagens complexos de Carroll foram transformados em seres unilaterais e caricatos, divididos entre "bonzinhos" e "malvados".
Tim Burton é um diretor extremamente talentoso e, normalmente, excelente para lidar com personagens desasjustados, como Alice. É uma pena que uma história tão boa tenha sido transformada em um filme repleto de clichês, sem graça e interessante apenas visualmente.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Ela era loucamente apaixonada por esse homem, mas numa espécie qualquer de delírio; nunca havia murmúrios e muxoxos naquela casa, apenas longas conversações e um profundo companheirismo que nenhum de nós jamais estaria apto a compreender. Algo de curiosamente frio e antipático que se desenrolava entre eles era, na verdade, um tipo de humor por meio do qual eles comunicavam um ao outro suas emoções mais variadas e sutis. O amor é tudo; Jane nunca se afastava mais do que três metros de Bull e nunca deixava de escutar uma só palavra dita por ele, e ele falava bem baixinho, pode ter certeza.

On the road - Jack Kerouack.